João 2.1-11
2º Domingo após Epifania - Ciclo do Tempo Comum - Ano C
P. William Felipe Zacarias
Amados irmãos, amadas irmãs,
poderíamos chamar esse casamento de “a festa atrapalhada”. Alguém não calculou as coisas direito. Alguém não planejou da forma certa. Na tradição judaica, as festas de casamento poderiam durar até sete dias. E então, em algum momento da festa, o vinho acabou! E não tinha a possibilidade de ir ao mercadinho da esquina comprar algumas “latinhas de cerveja”; não havia a possibilidade de servir outras bebidas como whisky ou champagne. Era vinho ou água – e água não se oferecia em uma festa de casamento. Em uma comparação atual, faltar o vinho na festa de casamento seria o mesmo que acabar o churrasco antes que todos os convidados estivessem servidos. Isso seria uma vergonha e um assunto que seria muito comentado por outras pessoas. E, dependendo do “cargo” e da “importância” da pessoa, o assunto poderia tomar dimensões ainda mais constrangedoras.
Em meio à situação, Maria, mãe de Jesus, ficou sabendo do acontecido e faz um comentário a Jesus. Ele, simplesmente responde, dizendo mais ou menos assim: “O que eu vou fazer com isso? Não fui eu quem organizou a festa”. Mas o que importa é que Maria conhecia o Filho que tinha. Ela conhecia Jesus! E sabia que ele poderia resolver aquela situação. E o conselho de Maria deve ser ouvido por nós protestantes, pois ela disse: “Fazei tudo o que Jesus vos disser” (João 2.5).
Como sabemos pelo desenrolar dessa história conhecida, seis talhas de pedra com capacidade aproximada de 100 litros cada foram preenchidas de água. Isso significa que continham cerca de 600 litros. São 300 garrafas pets de 2 litros cheias de água. Como ouvimos na leitura do Evangelho, o mestre sala foi chamado e provou a água transformada em vinho. Jesus não serviu primeiro aos seus discípulos porque seriam “suspeitos” diante do milagre. A testemunha do milagre precisa ser neutra! E logo em seguida o mestre sala elogiou ao noivo por ter deixado o melhor vinho para o final da festa.
Mas, além das coisas mais óbvias, o que esse texto quer nos ensinar?
1 DEUS COBRE A VERGONHA
O ser humano pecador facilmente passa vergonha. Essa história de João 2 me lembrou de outro casal. Em Gênesis 3, após a desobediência a Deus e a entrada do pecado no mundo, Adão e Eva se cobriram com folhas de figueira para esconderem a sua vergonha (cf. Gênesis 3.7), pois viram que estavam nus. Essa é uma das primeiras reações do ser humano quando descoberto na prática do erro: a vergonha – se a consciência já não estiver cauterizada. Embora quisessem a justificação cobrindo a vergonha com folhas de figueira, Adão e Eva não eliminaram o pecado por suas próprias obras. Por isso, Deus costurou roupas para o casal (cf. Gênesis 3.21): só o amor de Deus pode cobrir a vergonha e o pecado humano.
A falta de vinho seria uma vergonha muito grande tanto para os noivos quanto para os convidados que sentiriam vergonha alheia em meio à situação. Não sabemos o que realmente aconteceu. Talvez, aquele casal não tivesse condições de comprar vinho suficiente para todos por tantos dias, mas isso é especulação. O que sabemos é que a vergonha foi impedida através de um ato generoso de Deus em Jesus – mesmo que aquela ainda não fosse a hora da sua manifestação (cf. João 2.4). A festa não encontraria salvação por si mesma. Humanamente, não havia o que fazer. Contudo, a graça de Deus é abundante e se manifestou na abundância da água que se transformou em bom vinho.
O ser humano faz as suas “trapalhadas”, dá as suas “mancadas” e passa por situações constrangedoras criadas por ele mesmo. Queremos cobrir a nossa vergonha da nossa própria maneira – e fracassamos miseravelmente, principalmente diante de Deus que tudo conhece. Por isso, Deus generosamente nos ofereceu a abundância da graça em seu Filho Jesus Cristo que veio como Senhor e Salvador. Só nele temos a nossa salvação. Ele transbordou do amor do Trino Deus para preencher os vasos da nossa vida com o seu amor eterno.
2 JESUS REALIZA O SERVIÇO
Jesus não tinha obrigação alguma de “salvar a festa”. Ele era um convidado, não o organizador. Estava ali para celebrar, não para trabalhar. Contudo, o primeiro milagre de Jesus já sinaliza a marca do seu ministério de três anos: a diaconia, o serviço. Jesus é o Deus diácono. Jesus é o Deus que serve. E essa é a marca da vida cristã: o serviço.
Todos nós gostamos de participar de momentos marcantes. Quando vamos a um evento, a uma festa ou até ao culto, buscamos um momento de celebração, alegria e festa. Não esperamos ir a um lugar assim para “prestar um serviço”, mas para sermos servidos. Em seu primeiro milagre, Jesus inverteu completamente essa lógica: participar do seu Reino significa assumir o serviço.
Todos nós somos chamados ao serviço. Martinho Lutero chamava isso de “O Sacerdócio Geral de Todos os Crentes”. Na Igreja de Jesus, ser cristão não significa apenas vir, celebrar, alegrar-se e sossegar; no Reino de Deus, ser cristão não significa apenas receber, ser servido – e ir embora e “está pronto! Tudo certo! Ritual cumprido!”. O povo de Deus é servido por Jesus e é chamado ao serviço. Jesus, o Filho de Deus, mesmo sendo o dono de todas as coisas e rico em sua glória, se dispôs a transformar água em vinho para ajudar uma família que estava começando. Servir a Jesus não significa apenas vir e cumprir certos rituais, mas participar ativamente. E, olha, temos muito trabalho na Igreja de Jesus. “A seara é grande, mas os trabalhadores são poucos” (Mateus 9.37).
Jesus realizou o serviço. No caso dele, um serviço que ninguém mais poderia fazer: transformar água em vinho. Aqui na comunidade há serviços que você pode fazer ou até aprender a fazer. Há muitas pessoas sobrecarregadas em algumas funções: precisamos de mais pessoas para fazer a acolhida na chegada; precisamos de mais pessoas para anotarem motivos de oração no culto; precisamos de mais pessoas para cuidar da mesa de som e dos slides; precisamos de mais pessoas no louvor; precisamos de pessoas pra liderar o grupo de jovens, o grupo de casais e outros grupos... E aí? Vamos servir da mesma forma como Jesus, mesmo sendo Deus, se dispôs ao serviço.
3 A ALEGRIA É A CONSEQUÊNCIA
Depois da realização do milagre da transformação da água em vinho, a alegria foi uma consequência natural ao acontecido. Na Bíblia, o vinho simboliza a alegria. Não houve apenas uma transformação de substâncias, mas de sentimentos: o sentimento de vergonha foi trocado pelo sentimento de alegria. Houve prazer. Aquele era o melhor vinho.
Isso diz respeito à abundância da graça de Deus. Quando Deus age para cobrir a nossa vergonha e a nossa culpa, sobra a alegria e o prazer de pertencer a Deus e ao seu povo. Contudo, a alegria que Deus dá não é como a alegria que o mundo dá. A alegria do vinho também é passageira; a alegria de Cristo é eterna – oferecida no seu sangue. Prova disso é o testemunho do apóstolo Paulo que, mesmo na angústia da prisão, disse: “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo: alegrai-vos” (Filipenses 4.4).
Amados irmãos, amadas irmãs,
quem crê em Jesus Cristo está na festa. Hoje, Deus te faz o convite a aceitar a Jesus para uma nova vida: da água para o vinho. O convite de Deus hoje é que deixemos para trás a vida vazia, triste e egoísta para abraçarmos o milagre que traz abundância, alegria e diaconia. Em nossas “trapalhadas”, Jesus se manifestou não apenas como “solução”, mas como Salvador, pois não é um “amuleto” que soluciona problemas, mas o Senhor que salva integralmente as nossas vidas – quando a hora chegou, quando ele passou pelos tormentos da cruz e da ressurreição.
Que Deus transforme a tua vida “da água para o vinho” para uma vida disposta a serviço no Reino de Deus aqui na nossa comunidade. E que você possa ser presenteado com a alegria de servir abundantemente na Casa de Deus. O Senhor pode transformar toda a tua tristeza na abundância da alegria de viver o Reino de Deus. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os nossos corações e as nossas mentes, em Cristo Jesus, amém.