Isaías 58.9b-14
Lucas 13.10-17
Ciclo do Tempo Comum
P. William Felipe Zacarias
Amados irmãos, amadas irmãs,
vamos fazer um checklist: segunda-feira é dia de fazer o bem? E terça? E quarta? E quinta? E Sexta? E Sábado? Opa! Quando chega no Sábado, os problemas começam a aparecer – pois para muitos todo dia é dia de fazer o bem, menos no Sábado que é o Dia do Senhor conforme o 3º Mandamento: Santificarás o dia de descanso.
Jesus ousou fazer o bem em um Sábado e, por incrível que pareça, há pessoas que viram nisso um mal. Sabem de uma coisa, na vida é assim mesmo: muitas vezes praticamos o bem e, ainda assim, pessoas com corações mal-intencionados transformam o bem que fizemos em um mal! Foi isso o que aconteceu com Jesus. Por dezoito anos uma mulher sofria de uma enfermidade terrível que a fazia andar encurvada. Certamente seu problema de coluna lhe trazia dores terríveis. Ela foi a Jesus em um Sábado – e foi curada! Contudo, para o chefe da Sinagoga, “se ela esperou dezoito anos, poderia esperar mais um dia para ser curada. Um dia apenas não faria diferença”. Claro, ele pode pensar assim por que as dores não são dele, a coluna encurvada não é a dele e a doença não é dele! Os outros podem esperar...
Esse é o problema da interpretação fundamentalista das leis de Deus. Entre os judeus do segundo templo (época de Jesus), havia, por exemplo, os Saduceus que acreditavam que a revelação de Deus estava apenas no texto escrito da Torá (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio). Os Saduceus defendiam a Sola Scriptura – Somente a Escritura. Apenas o texto Bíblico! Ponto! Contudo, sabem qual era o problema dos Saduceus? Eles não defendiam o Solus Christus – Somente Cristo. E quando nós separamos o Somente a Escritura do Somente Cristo, não teremos como resultado outra coisa senão o fundamentalismo e o legalismo onde a Lei, ao invés de apontar para Cristo, se torna um fim em si mesma! A Lei deve ser cumprida porque é a Lei, nada mais! – Mesmo quando a Lei atropela quem está sofrendo.
Já outro grupo, os fariseus, admitiam que a revelação de Deus poderia ser encontrada tanto na tradição escrita quanto na tradição oral da história do seu povo. Para eles, Deus não revelou sua vontade apenas nos cinco primeiros livros da Bíblia, mas a continua revelando ao longo da história. Por isso, eles gostavam de criar novas leis – e de dizer que elas tinham vindo de Deus. Por exemplo, os fariseus determinaram que no Sábado as pessoas poderiam dar no máximo 1170 passos, o equivalente próximo a 880 metros. Se desse um passo a mais, já era desobediência e pecado! Aí sabem o que eles faziam? No Sábado, os fariseus iam pra cá e para lá em cima de um burrinho. Outros, talvez, davam “passos largos” para não pecar! Mais uma vez, a lei ao invés de servir e organizar a vida social e religiosa, se tornou um peso a ser cumprido com um fim em si mesmo. Por isso, também a tradição da Igreja sem o Somente Cristo incorre facilmente no erro do fundamentalismo e do legalismo.
O texto do evangelho não diz se o chefe da sinagoga era saduceu ou fariseu. Contudo, provavelmente ele fazia parte de um destes dois partidos religiosos. Fato é que Jesus desmascarou a hipocrisia daqueles que valorizam a lei como um fim em si mesma! Jesus não veio revogar a Lei, mas cumpri-la (cf. Mateus 5.17). O que Jesus faz é surpreendente: ele desmascara que os próprios defensores da Lei não conhecem a Lei! O texto de Isaías 58 nos demonstra isso, quando ele diz: “se abrires a tua alma ao faminto e fartares a alma aflita, então a tua luz nascerá nas trevas, e a escuridão será com o meio-dia” (Isaías 58.10). Essa recomendação de fazer o bem está no contexto do Sábado do Senhor. Contudo, os saduceus e fariseus parecem não conseguir interpretar isso adequadamente, pois eram escravos das suas próprias ideias – e talvez não há nada a que o ser humano se apegue de forma mais apaixonada do que às suas próprias ideias! O Sábado era justamente o dia de praticar o bem – mas os saduceus e fariseus estavam cegos demais pelas próprias ideias para enxergar o óbvio.
Jesus os acusa: dos seus interesses eles cuidam muito bem no sábado (cf. Lucas 13.16), contudo, quando é para ajudar aos outros, então eles se escondem atrás das próprias Leis para se verem desobrigados de praticar qualquer bem ao próximo. A acusação de Jesus foi tão reveladora que os seus adversários ficaram envergonhados!
Amados irmãos, amadas irmãs,
agora já podemos avançar no nosso checklist: Sábado é dia de fazer o bem? Sim, é! E o Domingo? Na tradição da Igreja, o dia do descanso foi transferido do Sábado para o Domingo por causa da ressurreição de Jesus. Domingo é o dia do Senhor – especialmente de ouvir a sua Palavra e estar em comunhão. Inclusive, este é o significado da palavra Domingo em latim: Dies Dominicus – o Dia do Senhor. Hoje, o dia do descanso tem sido individualizado e particularizado como um “dia para mim”. Contudo, Domingo é Dia do Senhor e, por isso, dia de fazer o bem ao próximo conforme a vontade de Deus revelada em Jesus. Por isso, no nosso checklist podemos marcar também o Domingo onde podemos fazer o bem de muitas formas: desde a oferta que colocamos no culto até no auxílio a alguém que vem nos pedir ajuda.
O fundamentalismo e o legalismo é sempre fruto da interpretação da Palavra de Deus com Somente a Escritura, mas sem Somente Cristo que traz o olhar misericordioso e compassivo para com o próximo. Não fomos feitos para o Sábado, mas o Sábado é que foi feito para nós. Isso significa: não basta o cumprimento da Lei como um fim em si mesma, mas é preciso descansar do trabalho e ajudar a quem precisa todos os dias. E como é bom podermos receber do descanso prometido por Deus.
O Senhor nos abençoe para que sempre interpretemos a sua Palavra a partir de Jesus. Martinho Lutero dizia: “A Bíblia é uma manjedoura na qual Jesus está deitado; se não o encontrarmos, só temos palha”. Os saduceus e fariseus ficaram apenas com a palha ao ignorarem o tesouro que é Jesus! Que nós não fiquemos apenas com a palha, mas vejamos o Senhor Jesus em toda a Bíblia para que recebamos a sua graça e sejamos justificados pela fé.
E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os nossos corações e as nossas mentes, em Cristo Jesus, amém.